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Por exemplo, suponha que um indivíduo que tem uma +cópia de um programa se encontre com outro que gostaria de ter uma cópia. É +possível a eles copiar o programa; quem deveria decidir se isto deve ser +feito ou não? Os indivíduos envolvidos? Ou outra parte, chamada de “o +proprietário”?</p> +<p> + Desenvolvedores de software tipicamente consideram estas questões assumindo +que o critério para a resposta seja maximizar os lucros dos +desenvolvedores. A força política do negócio tem levado à adoção, por parte +do governo, tanto deste critério quanto da resposta proposta pelos +desenvolvedores: o programa tem um proprietário, tipicamente uma empresa +associada ao seu desenvolvimento.</p> +<p> + Eu gostaria de considerar a mesma questão usando um critério diferente: a +prosperidade e liberdade do público em geral.</p> +<p> + Esta resposta não pode ser dada pela lei atual — a lei deveria agir em +conformidade com a ética, não o contrário. Nem a prática comum decide esta +questão, apesar de sugerir respostas possíveis. A única maneira de julgar é +ver quem é beneficiado e quem é prejudicado pelo reconhecimento dos +proprietários de software, porque, e quanto. Em outras palavras, nós +deveríamos fazer uma análise de custo-benefício tomando por base a sociedade +como um todo, levando em conta a liberdade individual bem como a produção de +bens materiais.</p> +<p> + Neste ensaio, eu irei descrever os efeitos de ter proprietários e mostrarei +que os resultados são malignos. Minha conclusão é que programadores têm a +responsabilidade de encorajar outros a compartilhar, redistribuir, estudar e +melhorar o software que nós escrevemos: em outras palavras, escrever <a +href="/philosophy/free-sw.html">software “livre”</a>.<a href="#f1">(1)</a></p> + +<h3 id="owner-justification">Como os Proprietários Justificam Seu Poder</h3> +<p> + Aqueles que se beneficiam do sistema atual onde programas são propriedade +oferecem dois argumentos em suporte à suas reivindicações: o argumento +emocional e o econômico.</p> +<p> + O argumento emocional é mais ou menos assim: “Eu coloquei meu suor, meu +coração, minha alma neste programa. Ele veio de <em>mim</em>, é +<em>meu</em>!”</p> +<p> + Este argumento não requer uma refutação pesada. O sentimento de ligação pode +ser cultivado pelos programadores quando lhes convém; não é +inevitável. Considere, por exemplo, quão sinceramente os mesmos +programadores transferem todos os seus direitos à uma grande empresa em +troca de um salário; a ligação emocional misteriosamente +desaparece. Contrastando, considere os grandes artistas e artesãos dos +tempos medievais, que nem mesmo assinavam seus nomes na sua obra. Para eles, +o nome do artista não era importante. O que importava era que o trabalho +havia sido feito — e o propósito ao qual ele serviria. Esta concepção +prevaleceu durante séculos.</p> +<p> + O argumento econômico se parece com: “Eu quero ficar rico (que via de regra +é descrito imprecisamente como ‘ganhar a vida’), e se você não +me permitir ficar rico programando, então eu não vou programar. Todos os +outros são como eu, sendo assim ninguém mais vai programar. E então você vai +acabar ficando sem programas!” Esta ameaça é normalmente velada, como um +conselho de amigo.</p> +<p> + Depois eu irei explicar que esta ameaça é um blefe. Primeiro eu quero focar +uma concepção que é mais visível em outra formulação do argumento.</p> +<p> + Esta formulação começa comparando a utilidade social de um programa +proprietário versus a da inexistência deste programa, e então conclui que o +desenvolvimento de software proprietário é, no todo, benéfico e deveria ser +encorajado. A falácia aqui está em comparar apenas dois pontos — software +proprietário versus inexistência do software — e assumir que não existem +outras possibilidades.</p> +<p> + Dado um sistema de copyright sobre programas, o desenvolvimento de software +comumente está ligado à existência de um proprietário que controla o uso do +software. Enquanto existe esta ligação, nós frequentemente nos deparamos com +a opção entre software proprietário ou nada. No entanto, esta ligação não é +natural ou inevitável; é uma consequência da escolha da política sócio-legal +que nós estamos questionando: a decisão de ter proprietários. Formular a +opção como sendo entre software proprietário versus software inexistente é +desvirtuar a questão.</p> + +<h3 id="against-having-owners">O Argumento Contra Ter Proprietários</h3> +<p> + A questão é: “O desenvolvimento de software deveria ser ligado a ter +proprietários para restringir sua utilização?”</p> +<p> + Para que nós possamos escolher, temos que julgar o efeito na sociedade de +cada uma destas duas atividades <em>independentemente</em>: o efeito de +desenvolver software (sem levar em consideração seus termos de +distribuição), e o efeito de restringir sua utilização (assumindo que o +software tenha sido desenvolvido). Se uma destas atividades ajuda e a outra +atrapalha, nós estaríamos melhor descartando esta ligação e fazendo apenas a +atividade que ajuda.</p> +<p> + Colocando em outras palavras, se a restrição da distribuição de um programa +já desenvolvido é prejudicial à sociedade como um todo, então um +desenvolvedor ético irá rejeitar a opção de trabalhar deste modo.</p> +<p> + Para determinar o efeito de restringir o compartilhamento, nós precisamos +comparar o valor para a sociedade de um programa restrito (por exemplo +proprietário) com o valor do mesmo programa, disponível para todos. Isto +significa comparar dois mundos possíveis.</p> +<p> + Esta análise também leva em consideração o contra-argumento feito às vezes +que “o benefício ao próximo de lhe dar uma cópia de um programa é cancelado +pelo dano feito ao proprietário.” Este contra-argumento assume que o dano e +o benefício são de igual grandeza. A análise envolve comparar estas duas +grandezas, e mostra que os benefícios são muito maiores.</p> +<p> + Para elucidar este argumento, vamos aplicá-lo a outra área: construção de +vias públicas.</p> +<p> + Seria possível financiar a construção de todas as vias com pedágios. Isto +iria exigir que houvesse postos de cobrança de pedágio em todas as +esquinas. Tal sistema produziria um grande incentivo para melhorar as +estradas. Teria também a virtude de fazer com que os usuários de qualquer +estrada pagassem por ela. No entanto, um posto de cobrança de pedágio é um +obstáculo artificial à condução suave de um veículo — artificial porque não +é uma consequência de como estradas ou carros funcionam.</p> +<p> + Comparando a utilidade das estradas gratuitas com a utilidade das estradas +onde há cobrança de pedágio, nós concluímos que (sendo igual todo o +restante) estradas sem pedágio são mais baratas de construir, mais baratas +para se usar, mais seguras e mais eficientes.<a href="#f2">(2)</a> Em uma +nação pobre, pedágios podem tornar as estradas proibitivas para muitos +cidadãos. As estradas sem pedágio oferecem assim mais benefícios à sociedade +a um custo menor; elas são preferíveis para a sociedade. Sendo assim, a +sociedade deveria se decidir por financiar as estradas de outra maneira, e +não por meio de pedágio. O uso das estradas, uma vez construídas, deveria +ser gratuito.</p> +<p> + Quando os defensores dos pedágios os propõem <em>meramente</em> como um modo +de levantar fundos, eles distorcem a opção que é disponível. Pedágios +arrecadam fundos, mas eles fazem algo além disso: em efeito, eles degradam a +estrada, no sentido de que a estrada com pedágio não é tão boa quanto a +gratuita; nos fornecer estradas em maior quantidade ou tecnicamente +superiores pode não ser uma melhoria se isto significa substituir as vias +gratuitas pelas vias com pedágio.</p> +<p> + É claro que a construção de uma estrada sem pedágio custa dinheiro, que o +público deve pagar de algum modo. No entanto, isto não implica +necessariamente na existência de postos de pedágio. Nós, que em qualquer dos +casos estaremos pagando, faremos melhor negócio adquirindo uma estrada livre +de pedágio.</p> +<p> + Eu não estou aqui dizendo que uma estrada com pedágio é pior que ficar sem +estrada. Isto seria verdade se a tarifa fosse tão alta que dificilmente +alguém usasse a estrada — mas isto é uma política pouco provável para um +arrecadador de impostos. No entanto, uma vez que os pedágios causem um +desperdício e inconveniência significativos, é melhor levantar fundos de um +modo menos perturbador.</p> +<p> + Para aplicar o mesmo argumento ao desenvolvimento de software, eu irei agora +mostrar que ter “pedágios” para programas úteis custa diariamente à +sociedade: torna os programas mais caros para construir, mais caros para +distribuir, e menos satisfatórios e eficientes para se usar. Segue que a +construção de programas deveria ser encorajada de algum outro modo. Então eu +irei explicar outros métodos de estímulo e (à medida do realmente +necessário) financiamento para o desenvolvimento de software.</p> + +<h4 id="harm-done">O Dano Causado por Software Obstruído</h4> +<p> + Considere por um momento que um programa tenha sido desenvolvido, e que +qualquer pagamentos necessários para seu desenvolvimento já tenham sido +feitos; agora a sociedade tem que decidir se deve torná-lo proprietário ou +se deve permitir seu livre uso e compartilhamento. Assuma que é desejável +que o programa exista e que esteja disponível.<a href="#f3">(3)</a></p> +<p> + Restrições na distribuição e modificação do programa não podem facilitar seu +uso. Só podem interferir. Sendo assim o efeito só pode ser negativo. Mas +quão negativo? E de que modo?</p> +<p> + Três níveis diferentes de danos materiais se originam desta obstrução:</p> + +<ul> +<li>Menos pessoas usam o programa.</li> + +<li>Nenhum dos usuários pode adaptar ou corrigir o programa.</li> + +<li>Outros desenvolvedores não podem aprender a partir do programa, ou basear um +novo trabalho nele.</li> +</ul> + +<p> + Cada nível de dano material tem uma forma concomitante de dano +psicossocial. Isto se refere ao efeito que as decisões das pessoas tem nos +seus sentimentos, atitudes e predisposições subsequentes. Estas alterações +na maneira de pensar das pessoas terão um efeito posterior no seu +relacionamento com seus concidadãos e podem ter consequências materiais.</p> +<p> + Os três níveis de danos materiais desperdiçam parte do valor que o programa +poderia prover, mas eles não podem reduzi-lo a zero. Se eles desperdiçassem +quase todo o valor do programa, então o programa causaria quase tanto dano à +sociedade quanto o esforço empregado para escrevê-lo. Pode-se dizer que um +programa que é lucrativo deveria prover algum benefício material líquido +direto.</p> +<p> + No entanto, levando em consideração o dano psicossocial concomitante, não +existe limite para os danos que o desenvolvimento de software proprietário +pode causar.</p> + +<h4 id="obstructing-use">Obstruindo O Uso de Programas</h4> +<p> + O primeiro nível de dano impede o simples uso de um programa. Uma cópia de +um programa tem um custo marginal de quase zero (e você pode pagar este +custo executando você mesmo a tarefa), sendo assim, num mercado livre, teria +um preço de quase zero. Uma taxa de licença é um desincentivo significativo +ao uso do programa. Se um programa de ampla utilidade é proprietário, muito +menos pessoas irão utilizá-lo.</p> +<p> + É fácil mostrar que a contribuição total de um programa para a sociedade é +reduzida atribuindo-se um proprietário a ele. Cada usuário potencial do +programa, deparado com a necessidade de pagar para utilizá-lo, pode escolher +pagar ou pode abrir mão do seu uso. Quando um usuário escolhe pagar, isto é +uma transferência de riqueza entre duas partes. Mas cada vez que alguém +escolhe abrir mão de usar o programa, isto causa um dano àquela pessoa sem +beneficiar ninguém. A soma dos números negativos e zeros deve ser negativa.</p> +<p> + Mas isto não reduz o montante de trabalho que é necessário para +<em>desenvolver</em> o programa. Como resultado, é reduzida a eficiência do +processo como um todo, em termos da satisfação de usuário proporcionada por +hora de trabalho.</p> +<p> + Isto traz à luz uma diferença crucial entre cópias de programas e carros, +cadeiras, ou sanduíches. Não existe máquina copiadora de objetos materiais, +a não ser em ficção científica. Mas programas são fáceis de copiar; qualquer +um pode produzir tantas cópias quantas quiser, com muito pouco esforço. Isto +não é verdade para objetos materiais porque a matéria é conservada: cada +nova cópia tem que ser construída de matéria-prima da mesma maneira que a +primeira cópia foi.</p> +<p> + Com objetos materiais, um desincentivo para utilizá-los faz sentido, porque +menos objetos comprados significa menos matéria-prima e trabalho necessários +para construí-los. É verdade que normalmente existe um custo inicial, um +custo de desenvolvimento, que é distribuído na produção em massa. Mas uma +vez que o custo de produção seja significativo, acrescentar uma parcela do +custo de desenvolvimento não faz uma diferença qualitativa. E não requer +restrições sobre a liberdade dos usuários comuns.</p> +<p> + No entanto, impor um preço em algo que de outro modo seria gratuito é uma +mudança qualitativa. Uma taxa centralmente imposta para a distribuição do +software se torna um desincentivo poderoso.</p> +<p> + E tem mais, a produção centralizada como é praticada atualmente é +ineficiente mesmo como meio de distribuição de cópias de software. Este +sistema envolve acomodar discos ou fitas em um empacotamento supérfluo, +enviando um grande número deles ao redor do mundo, e armazenando-os para a +venda. Este custo é apresentado como uma despesa de negócio; na verdade, é +parte do desperdício causado por ter proprietários.</p> + +<h4 id="damaging-social-cohesion">Prejudicando a União Social</h4> +<p> + Suponha que você e seu colega achassem útil rodar um certo programa. Num +consenso ético com seu colega você sente que a maneira apropriada de lidar +com a situação é permitir que ambos utilizem o programa. Uma proposta que +permitisse a somente um dos dois a utilização do programa excluindo o outro +causaria desarmonia; nem você nem seu colega achariam aceitável.</p> +<p> + Aceitar um típico acordo de licença de software significa trair seu colega: +“Eu prometo privar meu colega deste programa de modo que eu possa ter uma +cópia para mim.” As pessoas que fazem opções deste tipo sentem uma pressão +psicológica interna para se justificar, desmerecendo a importância da +cooperação mútua — assim o espírito público é prejudicado. Este é um dano +psicossocial associado com o dano material de desencorajar o uso do +programa.</p> +<p> + Muitos usuários inconscientemente reconhecem o erro de se recusar a +compartilhar, então eles decidem ignorar as licenças e as leis, e +compartilham programas de qualquer forma. Mas eles frequentemente se sentem +culpados por agirem assim. Eles sabem que devem quebrar as leis para serem +bons colegas, mas ainda assim reconhecem a autoridade das leis, então +concluem que ser um bom companheiro (que eles são) é perverso ou +vergonhoso. Isto também é um tipo de dano psicossocial, mas alguém pode +escapar disto decidindo que estas licenças e leis não têm força moral.</p> +<p> + Os programadores também sofrem dano psicossocial por saber que muitos +usuários não terão o direito de tirar proveito do seu trabalho. Isto leva a +uma atitude de cinismo ou negação. Um programador pode descrever +entusiasticamente o trabalho que ele acha tecnologicamente interessante; +então quando perguntado, “Eu vou poder usar isso?”, seu semblante cai e ele +admite que a resposta é não. Para evitar se sentir desestimulado, ele ou +ignora isso a maior parte do tempo ou adota uma postura cínica elaborada +para minimizar a relevância do fato.</p> +<p> + Desde a época do governo Reagan, a maior escassez nos Estados Unidos não é +inovação tecnológica e sim a disposição de trabalhar junto para o bem +público. Não faz sentido estimular o primeiro às custas do segundo.</p> + +<h4 id="custom-adaptation">Obstruindo a Adaptação Personalizada de Programas</h4> +<p> + O segundo nível de dano material é a impossibilidade de adaptar programas. A +facilidade de modificação do software é uma das suas grandes vantagens em +relação às tecnologias mais antigas. Mas a maior parte do software +disponível comercialmente não está disponível para modificação, mesmo depois +de você comprá-lo. Está disponível para você pegar ou largar, como uma caixa +preta — e isto é tudo.</p> +<p> + Um programa que você pode rodar consiste numa série de números cujo +significado é obscuro. Ninguém, nem mesmo um bom programador, pode +facilmente mudar os números para fazer com que o programa aja diferente.</p> +<p> + Programadores normalmente trabalham com o “código-fonte” do programa, que é +escrito numa linguagem de programação como Fortran ou C. Ela usa nomes para +designar os dados utilizados e as partes do programa, e representa operações +com símbolos como '+' para adição e '-' para subtração. Isto é feito para +auxiliar os programadores a ler e alterar programas. Aqui está um exemplo; +um programa para calcular a distância entre dois pontos num plano:</p> + +<pre> + float + distance (p0, p1) + struct point p0, p1; + { + float xdist = p1.x - p0.x; + float ydist = p1.y - p0.y; + return sqrt (xdist * xdist + ydist * ydist); + } +</pre> +<p> + O que o código-fonte precisamente significa não é o importante; o importante +é que isso se parece com álgebra, e uma pessoa que sabe essa linguagem de +programação vai entender seu significado e achar claro. Em contraste, aqui +está o mesmo programa na forma executável, no computador que eu normalmente +usava quando escrevi isso: +</p> + +<pre> + 1314258944 -232267772 -231844864 1634862 + 1411907592 -231844736 2159150 1420296208 + -234880989 -234879837 -234879966 -232295424 + 1644167167 -3214848 1090581031 1962942495 + 572518958 -803143692 1314803317 +</pre> + +<p> + Código-fonte é útil (no mínimo em potencial) para qualquer usuário de um +programa. Mas a maioria dos usuários não tem permissão para ter cópias do +código-fonte. Normalmente o código-fonte de um programa proprietário é +mantido em segredo pelo proprietário, evitando que qualquer pessoa possa +aprender a partir dele. Usuários recebem apenas os arquivos contendo números +incompreensíveis que o computador irá executar. Isto significa que somente o +proprietário do programa pode alterá-lo.</p> +<p> + Uma amiga me disse uma vez que ela estava trabalhando em um banco durante +aproximadamente seis meses, escrevendo um programa similar a algo que estava +disponível comercialmente. Ela acreditava que se pudesse ter acesso ao +código-fonte para aquele programa disponível comercialmente, ele poderia ter +sido adaptado facilmente às suas necessidades. O banco estava disposto a +pagar por isso, mas não lhe foi permitido — o código-fonte era um +segredo. Sendo assim ela teve que gastar seis meses nesta tarefa, trabalho +este que conta no Produto Interno Bruto (PIB) mas que na verdade foi +desperdício.</p> +<p> + O laboratório de Inteligência Artificial do <abbr title="Massachusetts +Institute of Technology">MIT</abbr> (laboratório de AI) recebeu uma +impressora gráfica como presente da Xerox por volta de 1977. Funcionava com +software livre ao qual nós adicionamos muitas funcionalidades +convenientes. Por exemplo, o software notificava um usuário imediatamente ao +término de uma impressão. Sempre que a impressora tinha algum problema, tal +como papel preso ou falta de papel, o software imediatamente notificava +todos os usuários que tinham impressões na fila. Estas funcionalidades +facilitavam a operação tranquila.</p> +<p> + Mais tarde a Xerox deu ao laboratório de AI uma impressora mais nova, mais +rápida, uma das primeiras impressoras a laser. Ela era controlada por um +software proprietário que rodava em um computador dedicado separado, sendo +assim nós não poderíamos acrescentar qualquer das nossas funcionalidades +favoritas. Nós poderíamos organizar as coisas de modo a enviar uma +notificação quando a tarefa de impressão fosse enviada ao computador +dedicado, mas não quando a impressão realmente fosse feita (e o atraso era +normalmente considerável). Não havia modo de saber quando a impressão era +realmente concluída; você poderia somente chutar. E ninguém era informado +quando havia um papel enroscado, de modo que a impressora frequentemente +ficava por uma hora parada.</p> +<p> + Os programadores de sistema do laboratório de AI eram capazes de corrigir +estes problemas, provavelmente tão capazes quanto os autores originais do +programa. A Xerox não estava interessada em corrigi-los no entanto, e +preferiu nos impedir, de modo que nós fomos forçados a aceitar os +problemas. Eles nunca foram corrigidos.</p> +<p> + A maioria dos bons programadores já passou por esta frustração. O banco pôde +se permitir resolver o problema escrevendo um novo programa do zero, mas um +usuário típico, não importa o quão conhecedor, não tem outra alternativa +senão desistir.</p> +<p> + Desistência causa dano psicossocial — ao espírito da autoconfiança. É +desmoralizante viver numa casa que você não pode reorganizar para satisfazer +as suas necessidades. Isto leva à resignação e desencorajamento, que pode se +espalhar e afetar outros aspectos da vida de uma pessoa. Pessoas que se +sentem assim são infelizes e não produzem um bom trabalho.</p> +<p> + Imagine o que aconteceria se receitas culinárias fossem entesouradas como o +software. Você poderia dizer, “Como eu mudo esta receita para tirar o sal?”, +e o grande chefe de cozinha te responderia, “Como ousa insultar minha +receita, o fruto do meu cérebro e do meu paladar, tentando mexer nela? Você +não tem conhecimento para alterar minha receita e fazê-la funcionar.”</p> +<p> + “Mas meu médico disse que eu não posso comer sal! O que eu posso fazer? Você +vai tirar o sal pra mim?”</p> +<p> + “Eu faria com muito prazer; meus honorários são de apenas $50.000.” Uma vez +que o proprietário tem o monopólio nas alterações, os honorários tendem a +ser grandes. “No entanto, justamente agora eu não tenho tempo. Estou ocupado +com uma comissão para projetar uma nova receita para o biscoito do navio +para o Departamento da Marinha. Posso te dar um retorno daqui a dois anos.”</p> + +<h4 id="software-development">Obstruindo Desenvolvimento de Software</h4> +<p> + O terceiro nível de dano material afeta o desenvolvimento de +software. Desenvolvimento de software costumava ser um processo +evolucionário, onde uma pessoa pegava um programa existente e reescrevia +partes dele para obter uma nova funcionalidade, e então outra pessoa iria +reescrever partes para adicionar outra funcionalidade; em alguns casos isso +continuava por um período de vinte anos. Neste meio-tempo, partes do +programa eram “canibalizadas” para formar o princípio de outros programas.</p> +<p> + A existência de proprietários impede este tipo de evolução, tornando +necessário começar do zero quando do desenvolvimento de um programa. Também +impede novos praticantes de estudar programas existentes para aprender +técnicas úteis ou mesmo como grandes programas podem ser estruturados.</p> +<p> + Proprietários também obstruem a educação. Eu tenho conhecido estudantes +brilhantes em ciência da computação que nunca viram o código-fonte de um +programa grande. Eles podem ser bons para escrever pequenos programas, mas +eles não podem começar a aprender os conhecimentos diferentes que são +necessários para a construção de grandes programas se eles não podem ver +como outros fizeram isto.</p> +<p> + Em qualquer área intelectual, uma pessoa pode alcançar maiores alturas +subindo nos ombros de outros. Mas geralmente isto não é mais permitido na +área de software — você pode somente subir nos ombros das outras pessoas +dentro <em>da sua empresa</em>.</p> +<p> + O dano psicossocial associado afeta o espírito da cooperação científica, que +costumava ser tão forte que cientistas cooperariam mesmo quando suas nações +estava em guerra. Imbuídos deste espírito, oceanógrafos japoneses +abandonando seu laboratório numa ilha do Pacífico cuidadosamente preservaram +seu trabalho para os soldados invasores dos Estados Unidos, e deixaram uma +nota pedindo que eles tomassem cuidado com aquilo.</p> +<p> + Conflitos por lucro têm destruído o que conflitos internacionais +pouparam. Hoje em dia cientistas em muitas áreas não publicam o suficiente +nos seus ensaios para permitir que outros reproduzam suas experiências. Eles +publicam somente o suficiente para permitir aos leitores maravilharem-se do +quanto eles foram capazes de fazer. Isto certamente é verdade em ciência da +computação, onde o código-fonte do programa relatado é normalmente secreto.</p> + +<h4 id="does-not-matter-how">Não Importa Como o Compartilhamento Seja Restringido</h4> +<p> + Eu discuti os efeitos de evitar que as pessoas copiem, alterem e construam +um programa. Eu não especifiquei como esta obstrução é feita, porque isto +não afeta a conclusão. Não importa se é feita através de proteção contra +cópia, copyright, licenças, criptografia, cartões <abbr title="Read-only +Memory">ROM</abbr>, números seriais de hardware, se é bem <em>sucedido</em> +então causa dano.</p> +<p> + Usuários consideram alguns destes métodos mais detestáveis que outros. Eu +sugiro que os métodos mais odiados são aqueles que atingem seu objetivo.</p> + +<h4 id="should-be-free">O Software Deveria ser Livre</h4> +<p> + Eu mostrei como a propriedade de um programa — o poder de restringir as +alterações ou a cópia dele — é obstrusivo. Seus efeitos negativos são +amplamente disseminados e importantes. Segue que a sociedade não deveria ter +proprietários para programas.</p> +<p> + Outra maneira de entender isto é ver que o que a sociedade precisa é de +software livre, e software proprietário é um substituto pobre. Encorajar o +substituto não é uma maneira racional de obter o que nós precisamos.</p> +<p> + Vaclav Havel nos aconselhou: “Trabalhe por algo porque é bom e não apenas +porque tem chance de sucesso.” Um negócio fazendo software proprietário tem +chance de sucesso dentro dos seus próprios termos limitados, mas não é o que +é bom para a sociedade.</p> + +<h3 id="why-develop">Por Que as Pessoas Irão Desenvolver Software</h3> +<p> + Se nós eliminarmos a copyright como meio de estimular pessoas a desenvolver +software, no início menos software será desenvolvido, mas este software será +mais útil. Não está claro se a satisfação geral proporcionada será menor; +mas se for, ou se de qualquer jeito nós quisermos aumentá-la, existem outras +maneiras de estimular desenvolvimento, assim como existem outras maneiras de +levantar fundos para estradas sem usar pedágios. Antes de falar a respeito +de como isso pode ser feito, primeiro eu gostaria de questionar o quanto de +incentivo artificial é realmente necessário.</p> + +<h4 id="fun">Programar é Divertido</h4> +<p> + Existem algumas linhas de trabalho em que poucos irão entrar exceto por +dinheiro; construção de rodovias, por exemplo. Existem outras áreas de +estudo e arte em que existe pouca chance de se tornar rico, em que pessoas +entram pela sua fascinação ou pelo percebido valor para a +sociedade. Exemplos incluem a lógica matemática, música clássica, +arqueologia e organização política entre trabalhadores. Pessoas competem por +novas vagas, nenhuma das quais é muito bem remunerada. Elas chegam até a +pagar pela chance de trabalhar na área, se elas têm condições para isso.</p> +<p> + Uma área assim pode se transformar do dia pra noite se começar a oferecer a +possibilidade de ficar rico. Quando um trabalhador fica rico, outros querem +a mesma oportunidade. Logo todos querem grandes somas em dinheiro para fazer +o que eles costumavam fazer por prazer. Quando se passam mais alguns anos, +todos ligados àquele campo irão ridicularizar a ideia que trabalho poderia +ser executado naquela área sem grandes retornos financeiros. Eles irão +aconselhar os planejadores sociais a assegurar que estes retornos sejam +possíveis, prescrevendo privilégios especiais, poderes e monopólios à medida +do necessário para que isto aconteça.</p> +<p> + Esta mudança aconteceu no campo da programação de computadores na década de +1980. Nos anos 70, havia artigos sobre “vício de computador”: usuários +estavam ficando “on-line” e tinham hábitos baratos. Era geralmente conhecido +que pessoas frequentemente amavam programação o suficiente para romper seus +casamentos. Hoje, é geralmente conhecido que ninguém iria programar exceto +por uma alta taxa de remuneração. As pessoas se esqueceram do que elas +sabiam naquela época.</p> +<p> + Quando é verdade em um determinado momento que a maioria das pessoas irão +trabalhar numa certa área por altos pagamentos, isto não precisa continuar +sendo verdade. A dinâmica da mudança pode acontecer ao contrário, se a +sociedade fornecer o ímpeto. Se nós tirarmos a possibilidade de grande +riqueza, então depois de um breve momento, quando as pessoas tiverem +reajustado suas atitudes, elas irão mais uma vez ansiar por trabalhar na +área pelo prazer da conquista.</p> +<p> + A questão “Como nós podemos pagar programadores?” se torna mais fácil quando +nós entendemos que não é uma questão de pagá-los uma fortuna. Um mero viver +é mais fácil de se conseguir.</p> + +<h4 id="funding">Financiando o Software Livre</h4> +<p> + Instituições que pagam programadores não têm que ser “software +houses”. Muitas outras instituições já existem que podem fazer isto.</p> +<p> + Fabricantes de equipamentos acham essencial suportar desenvolvimento de +software mesmo que eles não controlem o uso do software. Em 1970, muito do +seu software era livre porque eles não consideravam a possibilidade de +restringi-lo. Hoje, a sua crescente disposição para combinar consórcios +mostra seu entendimento que possuir o software não é o que é realmente +importante para eles.</p> +<p> + Universidades conduzem muitos projetos de programação. Hoje, elas +frequentemente vendem os resultados, mas nos anos 70, elas não +vendiam. Existe alguma dúvida de que as universidades iriam desenvolver +software livre se não lhes fosse permitido vender software? Estes projetos +poderiam ser financiados pelos mesmos contratos de governo e concessões que +agora financiam o desenvolvimento de software proprietário.</p> +<p> + É comum hoje para pesquisadores de universidade pegar concessão para +desenvolver um sistema, desenvolvê-lo até quase o término e dá-lo por +“terminado”, e então começar empresas onde eles realmente terminam o projeto +e o tornam útil. Às vezes eles declaram as versões inacabadas como +“gratuitas”; se eles são profundamente corruptos, eles em vez disso obtém +uma licença exclusiva da universidade. Isto não é nenhum segredo; é +abertamente admitido por todos os interessados. Já se os pesquisadores não +fossem expostos à tentação de fazer estas coisas, eles ainda assim fariam +suas pesquisas.</p> +<p> + Programadores que escrevem software livre podem ganhar a vida vendendo +serviços relacionados ao software. Eu tenho sido contratado para portar o <a +href="/software/gcc/">compilador C GNU</a> para novos equipamentos, e para +fazer extensões à interface do usuário no <a href="/software/emacs/">GNU +Emacs</a>. (Eu ofereço estas melhorias ao público uma vez que elas ficam +prontas.) Eu também ensino em salas de aula, pelo que eu sou pago.</p> +<p> + Eu não sou o único que trabalha desta forma; existe hoje uma empresa +crescente e bem sucedida que não faz outra coisa. Diversas outras empresas +também fornecem suporte comercial para software livre do sistema GNU. Isto é +o começo de uma indústria de suporte ao software independente — uma +indústria que poderia se tornar muito grande se o software livre se tornasse +predominante. Ela dá aos usuários uma opção geralmente não disponível para o +software proprietário, exceto para os muito ricos.</p> +<p> + Novas instituições tais como a <a href="/fsf/fsf.html">Free Software +Foundation</a> podem também pagar programadores. A maior parte dos fundos da +fundação vem de usuários comprarem fitas através do correio. O software nas +fitas é livre, o que significa que todo usuário tem a liberdade de copiá-lo +e alterá-lo, mas muitos apesar de tudo pagam para obter cópias. (Lembre-se +que “free software” se refere a liberdade e não preço). Alguns usuários +adquirem fitas para as quais eles já tem uma cópia, como uma maneira de +fazer uma contribuição que eles sentem que nós merecemos. A fundação também +recebe donativos consideráveis de fabricantes de computadores.</p> +<p> + A Free Software Foundation é uma entidade, e suas receitas são gastas +contratando tantos programadores quanto possível. Se ela tivesse sido feita +para ganhos financeiros, distribuindo o mesmo software livre ao público +pelos mesmos valores, daria agora uma vida muito boa ao seu fundador.</p> +<p> + Em virtude da fundação ser uma entidade, programadores frequentemente +trabalham pra ela por metade do que eles poderiam ganhar em outro +lugar. Eles fazem isto porque nós somos livres de burocracia, e porque eles +sentem satisfação em saber que seu trabalho não será obstruído. Acima de +tudo, eles fazem isso porque programar é divertido. Fora isso, voluntários +têm escrito muitos programas úteis para nós. (Recentemente mesmo escritores +técnicos começaram a se oferecer.)</p> +<p> + Isto confirma que programação está entre as áreas mais fascinantes de todas, +junto da música e da arte. Nós não temos medo que ninguém queira programar.</p> + +<h4 id="owe">O Que os Usuários Devem aos Desenvolvedores?</h4> +<p> + Existe uma boa razão para os usuários de software sentirem uma obrigação +moral de contribuir para seu suporte. Desenvolvedores de software livre +estão contribuindo para as atividades dos usuários, e é justo e a longo +prazo interessante para os usuários prover os fundos para continuar.</p> +<p> + No entanto, isto não se aplica a software proprietário, uma vez que o +obstrucionismo merece uma punição em vez de uma recompensa.</p> +<p> + Nós temos assim um paradoxo: o desenvolvedor de software útil tem direito ao +suporte dos usuários, mas qualquer tentativa de tornar esta obrigação moral +numa exigência destrói a base para a obrigação. Um desenvolvedor pode tanto +merecer a recompensa quanto exigi-la, mas não ambos.</p> +<p> + Eu acredito que um desenvolvedor ético defrontado com este paradoxo deve +agir de modo a merecer a recompensa, mas deveria também solicitar aos +usuários donativos voluntários. No final das contas os usuários irão +aprender a suportar os desenvolvedores sem coerção, assim como eles +aprenderam a suportar as estações públicas de rádio e televisão.</p> + +<h3 id="productivity">O Que É Produtividade De Software? </h3> +<p> + Se o software fosse livre, ainda assim existiriam programadores, mas talvez +um número menor deles. Seria isto ruim para a sociedade?</p> +<p> + Não necessariamente. Hoje as nações avançadas têm menos fazendeiros que em +1900, mas nós não achamos que isto seja ruim para a sociedade, porque os em +menor número fornecem mais comida aos consumidores do que os em maior número +faziam. Nós chamamos isso de produtividade melhorada. Software livre +exigiria muito menos programadores para satisfazer a demanda, por causa da +produtividade de software aumentada em todos os níveis:</p> + +<ul> +<li> Uso mais amplo de cada programa que é desenvolvido.</li> +<li> A habilidade de adaptar programas para personalização em vez de começar do +zero.</li> +<li> Melhor educação de programadores.</li> +<li> A eliminação de esforço de desenvolvimento duplicado.</li> +</ul> + +<p> + Aqueles que se opõem à cooperação porque isso resultaria no emprego de menos +programadores, estão na verdade se opondo à produtividade melhorada. Estas +mesmas pessoas normalmente concordam com a crença largamente aceita que a +indústria de software precisa de produtividade melhorada. Pode?</p> +<p> + “Produtividade de Software” pode significar duas coisas diferentes: a +produtividade geral de todo o desenvolvimento de software ou a produtividade +de projetos individuais. Produtividade geral é o que a sociedade gostaria de +ver melhorada e a maneira mais direta de fazer isto é eliminar os obstáculos +artificiais à cooperação que a reduzem. Mas pesquisadores que estudam a área +de “produtividade de software” focam somente no segundo, limitado, sentido +da frase, onde melhoria requer avanços tecnológicos difíceis.</p> + +<h3 id="competition">A Competição É Inevitável?</h3> +<p> + É inevitável que as pessoas tentem competir, sobrepujando seus rivais em +sociedade? Talvez sim. Mas competição por si só não é prejudicial; o que é +prejudicial é o <em>combate</em>.</p> +<p> + Existem maneiras de competir. Competição pode consistir de tentar alcançar +cada vez mais, exceder o que outros fizeram. Por exemplo, antigamente, +haviam competições entre magos da programação — competição para ver quem +poderia fazer o computador executar a coisa mais impressionante, ou fazer o +mais curto ou mais rápido programa para uma dada tarefa. Este tipo de +competição pode beneficiar a todos, <em>contanto que</em> o espírito +esportivo seja mantido.</p> +<p> + Competição construtiva é competição suficiente para motivar pessoas a +grandes esforços. Algumas pessoas estão competindo para ver quem será o +primeiro a ter visitado todos os países da Terra; alguns até mesmo já +gastaram fortunas tentando isso. Mas eles não subornam capitães de navio +para encalhar seus rivais em ilhas desertas. Eles estão satisfeitos em que +vença o melhor.</p> +<p> + Competição se torna combate quando os competidores começam a tentar impedir +um ao outro de avançar — quando o “que vença o melhor” dá lugar ao “que eu +vença, sendo ou não o melhor.” Software proprietário é prejudicial, não +porque seja uma forma de competição, mas porque é uma forma de combate entre +cidadãos da nossa sociedade.</p> +<p> + Competição em negócios não é necessariamente combate. Por exemplo, quando +duas mercearias competem, todo seu esforço é para melhorar as suas próprias +operações, não para sabotar a rival. Mas isto não demostra um compromisso +especial com a ética de negócios; em vez disso, há pouco espaço para combate +nesta linha de negócio a não ser violência física. Nem todas as áreas de +negócio compartilham esta característica. Ocultar informação que poderia +ajudar o avanço de todos é uma forma de combate.</p> +<p> + Ideologia de negócios não prepara pessoas para resistir à tentação de +combater na competição. Algumas formas de combate tem sido banidas com leis +antitruste, leis que exigem a verdade em anúncios, e assim por diante, mas +em vez de generalizar isto para obter um princípio de rejeição ao combate em +geral, executivos inventam outras formas de combate que não são +especificamente proibidas. Os recursos da sociedade são gastos no +equivalente econômico da guerra civil faccionária.</p> + +<h3 id="communism">“Por Que Você Não Se Muda Pra Rússia?”</h3> +<p> + Nos Estados Unidos, qualquer um que defenda outra coisa que não a mais +extrema forma de política egoísta de não intervencionismo tem ouvido +frequentemente esta acusação. Por exemplo, é dito isso aos que defendem um +sistema de saúde nacional, tal como os encontrados em todas as outras nações +industrializadas do mundo livre. Também dizem isso aos que defendem o +suporte público para as artes, também universal em nações desenvolvidas. A +ideia que cidadãos tenham qualquer obrigação para com o bem público é +identificada nos Estados Unidos como Comunismo. Mas quão similar são estas +ideias?</p> +<p> + Comunismo como praticado na União Soviética era um sistema de controle +central onde toda atividade era regimentada, supostamente para o bem comum, +mas na prática em prol dos membros do partido Comunista. E onde os +equipamentos de cópia eram guardados hermeticamente para evitar cópias +ilegais.</p> +<p> + O sistema Americano de copyright exerce um controle central sobre a +distribuição de um programa, e guarda os equipamentos de cópia com esquemas +de proteção contra cópia automáticos para evitar a cópia ilegal.</p> +<p> + Em contraste, eu estou trabalhando para construir um sistema onde pessoas +são livres para decidir suas própria ações; em particular, livres para +ajudar seus companheiros, e livres para alterar e melhorar as ferramentas +que elas usam no seu cotidiano. Um sistema baseado em cooperação voluntária +e decentralização.</p> +<p> + Assim, se nós temos que julgar pontos de vista pelas suas semelhanças com o +Comunismo Russo, são os proprietários de software que são os Comunistas.</p> + +<h3 id="premises">A Questão das Premissas</h3> +<p> + Eu assumo neste documento que um usuário de software não é menos importante +que um autor, ou até mesmo que o empregador de um autor. Em outras palavras, +seus interesses e necessidades têm igual peso, quando nós decidimos que +curso de ação é melhor.</p> +<p> + Esta premissa não é universalmente aceita. Muitos mantêm que um empregador +de autor é fundamentalmente mais importante que qualquer um. Eles dizem, por +exemplo, que o propósito de ter proprietários de software é dar ao +empregador do autor a vantagem que ele merece — sem levar em consideração +como isto pode afetar o público.</p> +<p> + Não é comum tentar provar ou desaprovar estas premissas. Prova requer +premissas compartilhadas. Sendo assim a maior parte do que eu disse é +somente para aqueles que compartilham as premissas que eu adoto, ou pelo +menos estão interessados em quais são suas consequências. Para aqueles que +acreditam que os proprietários são mais importantes que todos os demais, +este documento é irrelevante.</p> +<p> + Mas por que um grande número de Americanos iria aceitar uma premissa que +eleva certas pessoas em importância acima de todos os outros? Parcialmente +por causa do credo que esta premissa é parte das tradições legais da +sociedade Americana. Algumas pessoas sentem que duvidar da premissa +significa desafiar as bases da sociedade.</p> +<p> + É importante para estas pessoas saber que esta premissa não é parte da nossa +tradição legal. Nem nunca foi.</p> +<p> + Assim, a Constituição diz que o propósito do copyright é “promover o +progresso da ciência e das artes úteis.” A Suprema Corte foi além disso, +afirmando em <em>Fox Film vs. Doyal</em> que “O único interesse dos Estados +Unidos e o principal objetivo em conferir o monopólio [de copyright] reside +nos benefícios derivados pelo público a partir do trabalho dos autores.”</p> +<p> + Nós não temos que concordar com a Constituição ou com a Suprema Corte. (Uma +vez, ambas perdoaram a escravidão.) Sendo assim suas posições não desaprovam +a premissa da supremacia do proprietário. Mas eu espero que o anúncio que +isto é uma concepção radical direitista em vez de uma tradicionalmente +reconhecida venha enfraquecer seu apelo.</p> + +<h3 id="conclusion">Conclusão</h3> +<p> + Nós gostamos de pensar que nossa sociedade estimula o auxílio mútuo; mas +cada vez que nós recompensamos alguém pelo seu obstrucionismo, ou o +admiramos pela riqueza que ele ganhou deste modo, nós estamos enviando a +mensagem oposta.</p> +<p> + O entesouramento de software é uma faceta da nossa disposição geral de +desrespeitar o bem estar social em prol do ganho pessoal. Nós podemos vir +acompanhando este desrespeito desde Ronald Reagan a Dick Cheney, desde Exxon +a Enron, desde a falência dos bancos à falência das escolas. Podemos medir +isto pelo tamanho da população sem-teto e da população carcerária. Este +espírito antissocial alimenta a si mesmo; porque quanto mais nós vemos que +outras pessoas não irão nos ajudar, mais nos parece fútil ajudá-las. Assim a +sociedade vai decaindo até se tornar uma selva.</p> +<p> + Se nós não queremos viver numa selva, devemos mudar nossas atitudes. Devemos +começar enviando a mensagem que um bom cidadão é um que coopera quando +apropriado, não um que é bem sucedido tirando dos outros. Eu espero que o +movimento pelo software livre contribua para isto: pelo menos em uma área +nós iremos substituir a selva por um sistema mais eficiente que encoraja e +confia na cooperação voluntária.</p> + + +<h3 id="footnotes">Notas de Rodapé</h3> + +<ol> +<li id="f1">A palavra “free” em “free software” refere-se à liberdade, e não ao preço; o +preço pago por uma cópia de um “free software” pode ser zero, ou pequeno, ou +(raramente) bem grande.</li> + +<li id="f2">Os problemas da poluição e do congestionamento não alteram esta +conclusão. Se nós desejamos tornar o ato de guiar mais caro para +desencorajá-lo em geral, é desvantajoso fazer isto usando pedágios, que +contribuem tanto para a poluição quanto para o congestionamento. Um imposto +sobre a gasolina é muito melhor. Da mesma forma, um desejo de melhorar a +segurança limitando a velocidade máxima não é relevante; a via de acesso +livre melhora a velocidade média evitando paradas e atrasos, para qualquer +limite de velocidade dado.</li> + +<li id="f3">Alguém poderia observar que um programa de computador em particular é uma +coisa prejudicial e que não deveria estar disponível, como a base de dados +de informações pessoais Lotus Marketplace, que foi retirada de venda devido +à desaprovação pública. A maior parte do que eu digo não se aplica a este +caso, mas faz pouco sentido argumentar que seria bom ter um proprietário +porque ele tornaria o programa menos disponível. O proprietário não o +tornaria <em>completamente</em> não disponível, como seria desejável no caso +de um programa cujo uso fosse considerado destrutivo.</li> +</ol> + +<hr /> +<blockquote id="fsfs"><p class="big">Este ensaio foi publicado em <a +href="http://shop.fsf.org/product/free-software-free-society/"><cite>Software +Livre, Sociedade Livre: Artigos selecionados de Richard +M. Stallman</cite></a>.</p></blockquote> + +<div class="translators-notes"> + +<!--TRANSLATORS: Use space (SPC) as msgstr if you don't have notes.--> + </div> +</div> + +<!-- for id="content", starts in the include above --> +<!--#include virtual="/server/footer.pt-br.html" --> +<div id="footer"> +<div class="unprintable"> + +<p>Envie perguntas em geral sobre a FSF e o GNU para <a +href="mailto:gnu@gnu.org"><gnu@gnu.org></a>. Também existem <a +href="/contact/">outros meios de contatar</a> a FSF. 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