shouldbefree.html (50951B)
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Por exemplo, suponha que um indivíduo que tem uma 37 cópia de um programa se encontre com outro que gostaria de ter uma cópia. É 38 possível a eles copiar o programa; quem deveria decidir se isto deve ser 39 feito ou não? Os indivíduos envolvidos? Ou outra parte, chamada de “o dono”?</p> 40 <p> 41 Desenvolvedores de software tipicamente consideram estas questões assumindo 42 que o critério para a resposta seja maximizar os lucros dos 43 desenvolvedores. A força política do negócio tem levado à adoção, por parte 44 do governo, tanto deste critério quanto da resposta proposta pelos 45 desenvolvedores: o programa tem um dono, tipicamente uma empresa associada 46 ao seu desenvolvimento.</p> 47 <p> 48 Eu gostaria de considerar a mesma questão usando um critério diferente: a 49 prosperidade e liberdade do público em geral.</p> 50 <p> 51 Esta resposta não pode ser dada pela lei atual — a lei deveria agir em 52 conformidade com a ética, não o contrário. Nem a prática comum decide esta 53 questão, apesar de sugerir respostas possíveis. A única maneira de julgar é 54 ver quem é beneficiado e quem é prejudicado pelo reconhecimento dos donos de 55 software, porque, e quanto. Em outras palavras, nós deveríamos fazer uma 56 análise de custo-benefício tomando por base a sociedade como um todo, 57 levando em conta a liberdade individual bem como a produção de bens 58 materiais.</p> 59 <p> 60 Neste ensaio, eu irei descrever os efeitos de ter donos e mostrarei que os 61 resultados são malignos. Minha conclusão é que programadores têm a 62 responsabilidade de encorajar outros a compartilhar, redistribuir, estudar e 63 melhorar o software que nós escrevemos: em outras palavras, escrever <a 64 href="/philosophy/free-sw.html">software “livre”</a>.<a href="#f1">(1)</a></p> 65 66 <h3 id="owner-justification">Como os Donos Justificam Seu Poder</h3> 67 <p> 68 Aqueles que se beneficiam do sistema atual onde programas são propriedade 69 oferecem dois argumentos em suporte à suas reivindicações: o argumento 70 emocional e o econômico.</p> 71 <p> 72 O argumento emocional é mais ou menos assim: “Eu coloquei meu suor, meu 73 coração, minha alma neste programa. Ele veio de <em>mim</em>, é 74 <em>meu</em>!”</p> 75 <p> 76 Este argumento não requer uma refutação pesada. O sentimento de ligação pode 77 ser cultivado pelos programadores quando lhes convém; não é 78 inevitável. Considere, por exemplo, quão sinceramente os mesmos 79 programadores transferem todos os seus direitos à uma grande empresa em 80 troca de um salário; a ligação emocional misteriosamente 81 desaparece. Contrastando, considere os grandes artistas e artesãos dos 82 tempos medievais, que nem mesmo assinavam seus nomes na sua obra. Para eles, 83 o nome do artista não era importante. O que importava era que o trabalho 84 havia sido feito — e o propósito ao qual ele serviria. Esta concepção 85 prevaleceu durante séculos.</p> 86 <p> 87 O argumento econômico se parece com: “Eu quero ficar rico (que via de regra 88 é descrito imprecisamente como ‘ganhar a vida’), e se você não 89 me permitir ficar rico programando, então eu não vou programar. Todos os 90 outros são como eu, sendo assim ninguém mais vai programar. E então você vai 91 acabar ficando sem programas!” Esta ameaça é normalmente velada, como um 92 conselho de amigo.</p> 93 <p> 94 Depois eu irei explicar que esta ameaça é um blefe. Primeiro eu quero focar 95 uma concepção que é mais visível em outra formulação do argumento.</p> 96 <p> 97 Esta formulação começa comparando a utilidade social de um programa 98 privativo versus a da inexistência deste programa, e então conclui que o 99 desenvolvimento de software privativo é, no todo, benéfico e deveria ser 100 encorajado. A falácia aqui está em comparar apenas dois pontos — software 101 privativo versus inexistência do software — e assumir que não existem outras 102 possibilidades.</p> 103 <p> 104 Dado um sistema de copyright sobre programas, o desenvolvimento de software 105 comumente está ligado à existência de um dono que controla o uso do 106 software. Enquanto existe esta ligação, nós frequentemente nos deparamos com 107 a opção entre software privativo ou nada. No entanto, esta ligação não é 108 natural ou inevitável; é uma consequência da escolha da política sócio-legal 109 que nós estamos questionando: a decisão de ter donos. Formular a opção como 110 sendo entre software privativo versus software inexistente é desvirtuar a 111 questão.</p> 112 113 <h3 id="against-having-owners">O Argumento Contra Ter Donos</h3> 114 <p> 115 A questão é: “O desenvolvimento de software deveria ser ligado a ter donos 116 para restringir sua utilização?”</p> 117 <p> 118 Para que nós possamos escolher, temos que julgar o efeito na sociedade de 119 cada uma destas duas atividades <em>independentemente</em>: o efeito de 120 desenvolver software (sem levar em consideração seus termos de 121 distribuição), e o efeito de restringir sua utilização (assumindo que o 122 software tenha sido desenvolvido). Se uma destas atividades ajuda e a outra 123 atrapalha, nós estaríamos melhor descartando esta ligação e fazendo apenas a 124 atividade que ajuda.</p> 125 <p> 126 Colocando em outras palavras, se a restrição da distribuição de um programa 127 já desenvolvido é prejudicial à sociedade como um todo, então um 128 desenvolvedor ético irá rejeitar a opção de trabalhar deste modo.</p> 129 <p> 130 Para determinar o efeito de restringir o compartilhamento, nós precisamos 131 comparar o valor para a sociedade de um programa restrito (por exemplo, 132 privativo) com o valor do mesmo programa, disponível para todos. Isto 133 significa comparar dois mundos possíveis.</p> 134 <p> 135 Esta análise também leva em consideração o contra-argumento feito às vezes 136 que “o benefício ao próximo de lhe dar uma cópia de um programa é cancelado 137 pelo dano feito ao dono.” Este contra-argumento assume que o dano e o 138 benefício são de igual grandeza. A análise envolve comparar estas duas 139 grandezas, e mostra que os benefícios são muito maiores.</p> 140 <p> 141 Para elucidar este argumento, vamos aplicá-lo a outra área: construção de 142 vias públicas.</p> 143 <p> 144 Seria possível financiar a construção de todas as vias com pedágios. Isto 145 iria exigir que houvesse postos de cobrança de pedágio em todas as 146 esquinas. Tal sistema produziria um grande incentivo para melhorar as 147 estradas. Teria também a virtude de fazer com que os usuários de qualquer 148 estrada pagassem por ela. No entanto, um posto de cobrança de pedágio é um 149 obstáculo artificial à condução suave de um veículo — artificial porque não 150 é uma consequência de como estradas ou carros funcionam.</p> 151 <p> 152 Comparando a utilidade das estradas gratuitas com a utilidade das estradas 153 onde há cobrança de pedágio, nós concluímos que (sendo igual todo o 154 restante) estradas sem pedágio são mais baratas de construir, mais baratas 155 para se usar, mais seguras e mais eficientes.<a href="#f2">(2)</a> Em uma 156 nação pobre, pedágios podem tornar as estradas proibitivas para muitos 157 cidadãos. As estradas sem pedágio oferecem assim mais benefícios à sociedade 158 a um custo menor; elas são preferíveis para a sociedade. Sendo assim, a 159 sociedade deveria se decidir por financiar as estradas de outra maneira, e 160 não por meio de pedágio. O uso das estradas, uma vez construídas, deveria 161 ser gratuito.</p> 162 <p> 163 Quando os defensores dos pedágios os propõem <em>meramente</em> como um modo 164 de levantar fundos, eles distorcem a opção que é disponível. Pedágios 165 arrecadam fundos, mas eles fazem algo além disso: em efeito, eles degradam a 166 estrada, no sentido de que a estrada com pedágio não é tão boa quanto a 167 gratuita; nos fornecer estradas em maior quantidade ou tecnicamente 168 superiores pode não ser uma melhoria se isto significa substituir as vias 169 gratuitas pelas vias com pedágio.</p> 170 <p> 171 É claro que a construção de uma estrada sem pedágio custa dinheiro, que o 172 público deve pagar de algum modo. No entanto, isto não implica 173 necessariamente na existência de postos de pedágio. Nós, que em qualquer dos 174 casos estaremos pagando, faremos melhor negócio adquirindo uma estrada livre 175 de pedágio.</p> 176 <p> 177 Eu não estou aqui dizendo que uma estrada com pedágio é pior que ficar sem 178 estrada. Isto seria verdade se a tarifa fosse tão alta que dificilmente 179 alguém usasse a estrada — mas isto é uma política pouco provável para um 180 arrecadador de impostos. No entanto, uma vez que os pedágios causem um 181 desperdício e inconveniência significativos, é melhor levantar fundos de um 182 modo menos perturbador.</p> 183 <p> 184 Para aplicar o mesmo argumento ao desenvolvimento de software, eu irei agora 185 mostrar que ter “pedágios” para programas úteis custa diariamente à 186 sociedade: torna os programas mais caros para construir, mais caros para 187 distribuir, e menos satisfatórios e eficientes para se usar. Segue que a 188 construção de programas deveria ser encorajada de algum outro modo. Então eu 189 irei explicar outros métodos de estímulo e (à medida do realmente 190 necessário) financiamento para o desenvolvimento de software.</p> 191 192 <h4 id="harm-done">O Dano Causado por Software Obstruído</h4> 193 <p> 194 Considere por um momento que um programa tenha sido desenvolvido, e que 195 qualquer pagamentos necessários para seu desenvolvimento já tenham sido 196 feitos; agora a sociedade tem que decidir se deve torná-lo privativo ou se 197 deve permitir seu livre uso e compartilhamento. Assuma que é desejável que o 198 programa exista e que esteja disponível.<a href="#f3">(3)</a></p> 199 <p> 200 Restrições na distribuição e modificação do programa não podem facilitar seu 201 uso. Só podem interferir. Sendo assim o efeito só pode ser negativo. Mas 202 quão negativo? E de que modo?</p> 203 <p> 204 Três níveis diferentes de danos materiais se originam desta obstrução:</p> 205 206 <ul> 207 <li>Menos pessoas usam o programa.</li> 208 209 <li>Nenhum dos usuários pode adaptar ou corrigir o programa.</li> 210 211 <li>Outros desenvolvedores não podem aprender a partir do programa, ou basear um 212 novo trabalho nele.</li> 213 </ul> 214 215 <p> 216 Cada nível de dano material tem uma forma concomitante de dano 217 psicossocial. Isto se refere ao efeito que as decisões das pessoas tem nos 218 seus sentimentos, atitudes e predisposições subsequentes. Estas alterações 219 na maneira de pensar das pessoas terão um efeito posterior no seu 220 relacionamento com seus concidadãos e podem ter consequências materiais.</p> 221 <p> 222 Os três níveis de danos materiais desperdiçam parte do valor que o programa 223 poderia prover, mas eles não podem reduzi-lo a zero. Se eles desperdiçassem 224 quase todo o valor do programa, então o programa causaria quase tanto dano à 225 sociedade quanto o esforço empregado para escrevê-lo. Pode-se dizer que um 226 programa que é lucrativo deveria prover algum benefício material líquido 227 direto.</p> 228 <p> 229 No entanto, levando em consideração o dano psicossocial concomitante, não 230 existe limite para os danos que o desenvolvimento de software privativo pode 231 causar.</p> 232 233 <h4 id="obstructing-use">Obstruindo O Uso de Programas</h4> 234 <p> 235 O primeiro nível de dano impede o simples uso de um programa. Uma cópia de 236 um programa tem um custo marginal de quase zero (e você pode pagar este 237 custo executando você mesmo a tarefa), sendo assim, num mercado livre, teria 238 um preço de quase zero. Uma taxa de licença é um desincentivo significativo 239 ao uso do programa. Se um programa de ampla utilidade é privativo, muito 240 menos pessoas irão utilizá-lo.</p> 241 <p> 242 É fácil mostrar que a contribuição total de um programa para a sociedade é 243 reduzida atribuindo-se um dono a ele. Cada usuário potencial do programa, 244 deparado com a necessidade de pagar para utilizá-lo, pode escolher pagar ou 245 pode abrir mão do seu uso. Quando um usuário escolhe pagar, isto é uma 246 transferência de riqueza entre duas partes. Mas cada vez que alguém escolhe 247 abrir mão de usar o programa, isto causa um dano àquela pessoa sem 248 beneficiar ninguém. A soma dos números negativos e zeros deve ser negativa.</p> 249 <p> 250 Mas isto não reduz o montante de trabalho que é necessário para 251 <em>desenvolver</em> o programa. Como resultado, é reduzida a eficiência do 252 processo como um todo, em termos da satisfação de usuário proporcionada por 253 hora de trabalho.</p> 254 <p> 255 Isto traz à luz uma diferença crucial entre cópias de programas e carros, 256 cadeiras, ou sanduíches. Não existe máquina copiadora de objetos materiais, 257 a não ser em ficção científica. Mas programas são fáceis de copiar; qualquer 258 um pode produzir tantas cópias quantas quiser, com muito pouco esforço. Isto 259 não é verdade para objetos materiais porque a matéria é conservada: cada 260 nova cópia tem que ser construída de matéria-prima da mesma maneira que a 261 primeira cópia foi.</p> 262 <p> 263 Com objetos materiais, um desincentivo para utilizá-los faz sentido, porque 264 menos objetos comprados significa menos matéria-prima e trabalho necessários 265 para construí-los. É verdade que normalmente existe um custo inicial, um 266 custo de desenvolvimento, que é distribuído na produção em massa. Mas uma 267 vez que o custo de produção seja significativo, acrescentar uma parcela do 268 custo de desenvolvimento não faz uma diferença qualitativa. E não requer 269 restrições sobre a liberdade dos usuários comuns.</p> 270 <p> 271 No entanto, impor um preço em algo que de outro modo seria gratuito é uma 272 mudança qualitativa. Uma taxa centralmente imposta para a distribuição do 273 software se torna um desincentivo poderoso.</p> 274 <p> 275 E tem mais, a produção centralizada como é praticada atualmente é 276 ineficiente mesmo como meio de distribuição de cópias de software. Este 277 sistema envolve acomodar discos ou fitas em um empacotamento supérfluo, 278 enviando um grande número deles ao redor do mundo, e armazenando-os para a 279 venda. Este custo é apresentado como uma despesa de negócio; na verdade, é 280 parte do desperdício causado por ter donos.</p> 281 282 <h4 id="damaging-social-cohesion">Prejudicando a União Social</h4> 283 <p> 284 Suponha que você e seu colega achassem útil rodar um certo programa. Num 285 consenso ético com seu colega você sente que a maneira apropriada de lidar 286 com a situação é permitir que ambos utilizem o programa. Uma proposta que 287 permitisse a somente um dos dois a utilização do programa excluindo o outro 288 causaria desarmonia; nem você nem seu colega achariam aceitável.</p> 289 <p> 290 Aceitar um típico acordo de licença de software significa trair seu colega: 291 “Eu prometo privar meu colega deste programa de modo que eu possa ter uma 292 cópia para mim.” As pessoas que fazem opções deste tipo sentem uma pressão 293 psicológica interna para se justificar, desmerecendo a importância da 294 cooperação mútua — assim o espírito público é prejudicado. Este é um dano 295 psicossocial associado com o dano material de desencorajar o uso do 296 programa.</p> 297 <p> 298 Muitos usuários inconscientemente reconhecem o erro de se recusar a 299 compartilhar, então eles decidem ignorar as licenças e as leis, e 300 compartilham programas de qualquer forma. Mas eles frequentemente se sentem 301 culpados por agirem assim. Eles sabem que devem quebrar as leis para serem 302 bons colegas, mas ainda assim reconhecem a autoridade das leis, então 303 concluem que ser um bom companheiro (que eles são) é perverso ou 304 vergonhoso. Isto também é um tipo de dano psicossocial, mas alguém pode 305 escapar disto decidindo que estas licenças e leis não têm força moral.</p> 306 <p> 307 Os programadores também sofrem dano psicossocial por saber que muitos 308 usuários não terão o direito de tirar proveito do seu trabalho. Isto leva a 309 uma atitude de cinismo ou negação. Um programador pode descrever 310 entusiasticamente o trabalho que ele acha tecnologicamente interessante; 311 então quando perguntado, “Eu vou poder usar isso?”, seu semblante cai e ele 312 admite que a resposta é não. Para evitar se sentir desestimulado, ele ou 313 ignora isso a maior parte do tempo ou adota uma postura cínica elaborada 314 para minimizar a relevância do fato.</p> 315 <p> 316 Desde a época do governo Reagan, a maior escassez nos Estados Unidos não é 317 inovação tecnológica e sim a disposição de trabalhar junto para o bem 318 público. Não faz sentido estimular o primeiro às custas do segundo.</p> 319 320 <h4 id="custom-adaptation">Obstruindo a Adaptação Personalizada de Programas</h4> 321 <p> 322 O segundo nível de dano material é a impossibilidade de adaptar programas. A 323 facilidade de modificação do software é uma das suas grandes vantagens em 324 relação às tecnologias mais antigas. Mas a maior parte do software 325 disponível comercialmente não está disponível para modificação, mesmo depois 326 de você comprá-lo. Está disponível para você pegar ou largar, como uma caixa 327 preta — e isto é tudo.</p> 328 <p> 329 Um programa que você pode rodar consiste numa série de números cujo 330 significado é obscuro. Ninguém, nem mesmo um bom programador, pode 331 facilmente mudar os números para fazer com que o programa aja diferente.</p> 332 <p> 333 Programadores normalmente trabalham com o “código-fonte” do programa, que é 334 escrito numa linguagem de programação como Fortran ou C. Ela usa nomes para 335 designar os dados utilizados e as partes do programa, e representa operações 336 com símbolos como '+' para adição e '-' para subtração. Isto é feito para 337 auxiliar os programadores a ler e alterar programas. Aqui está um exemplo; 338 um programa para calcular a distância entre dois pontos num plano:</p> 339 340 <pre> 341 float 342 distance (p0, p1) 343 struct point p0, p1; 344 { 345 float xdist = p1.x - p0.x; 346 float ydist = p1.y - p0.y; 347 return sqrt (xdist * xdist + ydist * ydist); 348 } 349 </pre> 350 <p> 351 O que o código-fonte precisamente significa não é o importante; o importante 352 é que isso se parece com álgebra, e uma pessoa que sabe essa linguagem de 353 programação vai entender seu significado e achar claro. Em contraste, aqui 354 está o mesmo programa na forma executável, no computador que eu normalmente 355 usava quando escrevi isso: 356 </p> 357 358 <pre> 359 1314258944 -232267772 -231844864 1634862 360 1411907592 -231844736 2159150 1420296208 361 -234880989 -234879837 -234879966 -232295424 362 1644167167 -3214848 1090581031 1962942495 363 572518958 -803143692 1314803317 364 </pre> 365 366 <p> 367 Código-fonte é útil (no mínimo em potencial) para qualquer usuário de um 368 programa. Mas a maioria dos usuários não tem permissão para ter cópias do 369 código-fonte. Normalmente o código-fonte de um programa privativo é mantido 370 em segredo pelo dono, evitando que qualquer pessoa possa aprender a partir 371 dele. Usuários recebem apenas os arquivos contendo números incompreensíveis 372 que o computador irá executar. Isto significa que somente o dono do programa 373 pode alterá-lo.</p> 374 <p> 375 Uma amiga me disse uma vez que ela estava trabalhando em um banco durante 376 aproximadamente seis meses, escrevendo um programa similar a algo que estava 377 disponível comercialmente. Ela acreditava que se pudesse ter acesso ao 378 código-fonte para aquele programa disponível comercialmente, ele poderia ter 379 sido adaptado facilmente às suas necessidades. O banco estava disposto a 380 pagar por isso, mas não lhe foi permitido — o código-fonte era um 381 segredo. Sendo assim ela teve que gastar seis meses nesta tarefa, trabalho 382 este que conta no Produto Interno Bruto (PIB) mas que na verdade foi 383 desperdício.</p> 384 <p> 385 O laboratório de Inteligência Artificial do <abbr title="Massachusetts 386 Institute of Technology">MIT</abbr> (laboratório de AI) recebeu uma 387 impressora gráfica como presente da Xerox por volta de 1977. Funcionava com 388 software livre ao qual nós adicionamos muitas funcionalidades 389 convenientes. Por exemplo, o software notificava um usuário imediatamente ao 390 término de uma impressão. Sempre que a impressora tinha algum problema, tal 391 como papel preso ou falta de papel, o software imediatamente notificava 392 todos os usuários que tinham impressões na fila. Estas funcionalidades 393 facilitavam a operação tranquila.</p> 394 <p> 395 Mais tarde a Xerox deu ao laboratório de AI uma impressora mais nova, mais 396 rápida, uma das primeiras impressoras a laser. Ela era controlada por um 397 software privativo que rodava em um computador dedicado separado, sendo 398 assim nós não poderíamos acrescentar qualquer das nossas funcionalidades 399 favoritas. Nós poderíamos organizar as coisas de modo a enviar uma 400 notificação quando a tarefa de impressão fosse enviada ao computador 401 dedicado, mas não quando a impressão realmente fosse feita (e o atraso era 402 normalmente considerável). Não havia modo de saber quando a impressão era 403 realmente concluída; você poderia somente chutar. E ninguém era informado 404 quando havia um papel enroscado, de modo que a impressora frequentemente 405 ficava por uma hora parada.</p> 406 <p> 407 Os programadores de sistema do laboratório de AI eram capazes de corrigir 408 estes problemas, provavelmente tão capazes quanto os autores originais do 409 programa. A Xerox não estava interessada em corrigi-los no entanto, e 410 preferiu nos impedir, de modo que nós fomos forçados a aceitar os 411 problemas. Eles nunca foram corrigidos.</p> 412 <p> 413 A maioria dos bons programadores já passou por esta frustração. O banco pôde 414 se permitir resolver o problema escrevendo um novo programa do zero, mas um 415 usuário típico, não importa o quão conhecedor, não tem outra alternativa 416 senão desistir.</p> 417 <p> 418 Desistência causa dano psicossocial — ao espírito da autoconfiança. É 419 desmoralizante viver numa casa que você não pode reorganizar para satisfazer 420 as suas necessidades. Isto leva à resignação e desencorajamento, que pode se 421 espalhar e afetar outros aspectos da vida de uma pessoa. Pessoas que se 422 sentem assim são infelizes e não produzem um bom trabalho.</p> 423 <p> 424 Imagine o que aconteceria se receitas culinárias fossem entesouradas como o 425 software. Você poderia dizer, “Como eu mudo esta receita para tirar o sal?”, 426 e o grande chefe de cozinha te responderia, “Como ousa insultar minha 427 receita, o fruto do meu cérebro e do meu paladar, tentando mexer nela? Você 428 não tem conhecimento para alterar minha receita e fazê-la funcionar.”</p> 429 <p> 430 “Mas meu médico disse que eu não posso comer sal! O que eu posso fazer? Você 431 vai tirar o sal pra mim?”</p> 432 <p> 433 “Eu faria com muito prazer; meus honorários são de apenas $50.000.” Uma vez 434 que o dono tem o monopólio nas alterações, os honorários tendem a ser 435 grandes. “No entanto, justamente agora eu não tenho tempo. Estou ocupado com 436 uma comissão para projetar uma nova receita para o biscoito do navio para o 437 Departamento da Marinha. Posso te dar um retorno daqui a dois anos.”</p> 438 439 <h4 id="software-development">Obstruindo Desenvolvimento de Software</h4> 440 <p> 441 O terceiro nível de dano material afeta o desenvolvimento de 442 software. Desenvolvimento de software costumava ser um processo 443 evolucionário, onde uma pessoa pegava um programa existente e reescrevia 444 partes dele para obter uma nova funcionalidade, e então outra pessoa iria 445 reescrever partes para adicionar outra funcionalidade; em alguns casos isso 446 continuava por um período de vinte anos. Neste meio-tempo, partes do 447 programa eram “canibalizadas” para formar o princípio de outros programas.</p> 448 <p> 449 A existência de donos impede este tipo de evolução, tornando necessário 450 começar do zero quando do desenvolvimento de um programa. Também impede 451 novos praticantes de estudar programas existentes para aprender técnicas 452 úteis ou mesmo como grandes programas podem ser estruturados.</p> 453 <p> 454 Donos também obstruem a educação. Eu tenho conhecido estudantes brilhantes 455 em ciência da computação que nunca viram o código-fonte de um programa 456 grande. Eles podem ser bons para escrever pequenos programas, mas eles não 457 podem começar a aprender os conhecimentos diferentes que são necessários 458 para a construção de grandes programas se eles não podem ver como outros 459 fizeram isto.</p> 460 <p> 461 Em qualquer área intelectual, uma pessoa pode alcançar maiores alturas 462 subindo nos ombros de outros. Mas geralmente isto não é mais permitido na 463 área de software — você pode somente subir nos ombros das outras pessoas 464 dentro <em>da sua empresa</em>.</p> 465 <p> 466 O dano psicossocial associado afeta o espírito da cooperação científica, que 467 costumava ser tão forte que cientistas cooperariam mesmo quando suas nações 468 estava em guerra. Imbuídos deste espírito, oceanógrafos japoneses 469 abandonando seu laboratório numa ilha do Pacífico cuidadosamente preservaram 470 seu trabalho para os soldados invasores dos Estados Unidos, e deixaram uma 471 nota pedindo que eles tomassem cuidado com aquilo.</p> 472 <p> 473 Conflitos por lucro têm destruído o que conflitos internacionais 474 pouparam. Hoje em dia cientistas em muitas áreas não publicam o suficiente 475 nos seus ensaios para permitir que outros reproduzam suas experiências. Eles 476 publicam somente o suficiente para permitir aos leitores maravilharem-se do 477 quanto eles foram capazes de fazer. Isto certamente é verdade em ciência da 478 computação, onde o código-fonte do programa relatado é normalmente secreto.</p> 479 480 <h4 id="does-not-matter-how">Não Importa Como o Compartilhamento Seja Restringido</h4> 481 <p> 482 Eu discuti os efeitos de evitar que as pessoas copiem, alterem e construam 483 um programa. Eu não especifiquei como esta obstrução é feita, porque isto 484 não afeta a conclusão. Não importa se é feita através de proteção contra 485 cópia, copyright, licenças, criptografia, cartões <abbr title="Read-only 486 Memory">ROM</abbr>, números seriais de hardware, se é bem <em>sucedido</em> 487 então causa dano.</p> 488 <p> 489 Usuários consideram alguns destes métodos mais detestáveis que outros. Eu 490 sugiro que os métodos mais odiados são aqueles que atingem seu objetivo.</p> 491 492 <h4 id="should-be-free">O Software Deveria ser Livre</h4> 493 <p> 494 Eu mostrei como a propriedade de um programa — o poder de restringir as 495 alterações ou a cópia dele — é obstrusivo. Seus efeitos negativos são 496 amplamente disseminados e importantes. Segue que a sociedade não deveria ter 497 donos para programas.</p> 498 <p> 499 Outra maneira de entender isto é ver que o que a sociedade precisa é de 500 software livre, e software privativo é um substituto pobre. Encorajar o 501 substituto não é uma maneira racional de obter o que nós precisamos.</p> 502 <p> 503 Vaclav Havel nos aconselhou: “Trabalhe por algo porque é bom e não apenas 504 porque tem chance de sucesso.” Um negócio fazendo software privativo tem 505 chance de sucesso dentro dos seus próprios termos limitados, mas não é o que 506 é bom para a sociedade.</p> 507 508 <h3 id="why-develop">Por Que as Pessoas Irão Desenvolver Software</h3> 509 <p> 510 Se nós eliminarmos a copyright como meio de estimular pessoas a desenvolver 511 software, no início menos software será desenvolvido, mas este software será 512 mais útil. Não está claro se a satisfação geral proporcionada será menor; 513 mas se for, ou se de qualquer jeito nós quisermos aumentá-la, existem outras 514 maneiras de estimular desenvolvimento, assim como existem outras maneiras de 515 levantar fundos para estradas sem usar pedágios. Antes de falar a respeito 516 de como isso pode ser feito, primeiro eu gostaria de questionar o quanto de 517 incentivo artificial é realmente necessário.</p> 518 519 <h4 id="fun">Programar é Divertido</h4> 520 <p> 521 Existem algumas linhas de trabalho em que poucos irão entrar exceto por 522 dinheiro; construção de rodovias, por exemplo. Existem outras áreas de 523 estudo e arte em que existe pouca chance de se tornar rico, em que pessoas 524 entram pela sua fascinação ou pelo percebido valor para a 525 sociedade. Exemplos incluem a lógica matemática, música clássica, 526 arqueologia e organização política entre trabalhadores. Pessoas competem por 527 novas vagas, nenhuma das quais é muito bem remunerada. Elas chegam até a 528 pagar pela chance de trabalhar na área, se elas têm condições para isso.</p> 529 <p> 530 Uma área assim pode se transformar do dia pra noite se começar a oferecer a 531 possibilidade de ficar rico. Quando um trabalhador fica rico, outros querem 532 a mesma oportunidade. Logo todos querem grandes somas em dinheiro para fazer 533 o que eles costumavam fazer por prazer. Quando se passam mais alguns anos, 534 todos ligados àquele campo irão ridicularizar a ideia que trabalho poderia 535 ser executado naquela área sem grandes retornos financeiros. Eles irão 536 aconselhar os planejadores sociais a assegurar que estes retornos sejam 537 possíveis, prescrevendo privilégios especiais, poderes e monopólios à medida 538 do necessário para que isto aconteça.</p> 539 <p> 540 Esta mudança aconteceu no campo da programação de computadores na década de 541 1980. Nos anos 70, havia artigos sobre “vício de computador”: usuários 542 estavam ficando “on-line” e tinham hábitos baratos. Era geralmente conhecido 543 que pessoas frequentemente amavam programação o suficiente para romper seus 544 casamentos. Hoje, é geralmente conhecido que ninguém iria programar exceto 545 por uma alta taxa de remuneração. As pessoas se esqueceram do que elas 546 sabiam naquela época.</p> 547 <p> 548 Quando é verdade em um determinado momento que a maioria das pessoas irão 549 trabalhar numa certa área por altos pagamentos, isto não precisa continuar 550 sendo verdade. A dinâmica da mudança pode acontecer ao contrário, se a 551 sociedade fornecer o ímpeto. Se nós tirarmos a possibilidade de grande 552 riqueza, então depois de um breve momento, quando as pessoas tiverem 553 reajustado suas atitudes, elas irão mais uma vez ansiar por trabalhar na 554 área pelo prazer da conquista.</p> 555 <p> 556 A questão “Como nós podemos pagar programadores?” se torna mais fácil quando 557 nós entendemos que não é uma questão de pagá-los uma fortuna. Um mero viver 558 é mais fácil de se conseguir.</p> 559 560 <h4 id="funding">Financiando o Software Livre</h4> 561 <p> 562 Instituições que pagam programadores não têm que ser “software 563 houses”. Muitas outras instituições já existem que podem fazer isto.</p> 564 <p> 565 Fabricantes de equipamentos acham essencial suportar desenvolvimento de 566 software mesmo que eles não controlem o uso do software. Em 1970, muito do 567 seu software era livre porque eles não consideravam a possibilidade de 568 restringi-lo. Hoje, a sua crescente disposição para combinar consórcios 569 mostra seu entendimento que possuir o software não é o que é realmente 570 importante para eles.</p> 571 <p> 572 Universidades conduzem muitos projetos de programação. Hoje, elas 573 frequentemente vendem os resultados, mas nos anos 70, elas não 574 vendiam. Existe alguma dúvida de que as universidades iriam desenvolver 575 software livre se não lhes fosse permitido vender software? Estes projetos 576 poderiam ser financiados pelos mesmos contratos de governo e concessões que 577 agora financiam o desenvolvimento de software privativo.</p> 578 <p> 579 É comum hoje para pesquisadores de universidade pegar concessão para 580 desenvolver um sistema, desenvolvê-lo até quase o término e dá-lo por 581 “terminado”, e então começar empresas onde eles realmente terminam o projeto 582 e o tornam útil. Às vezes eles declaram as versões inacabadas como 583 “gratuitas”; se eles são profundamente corruptos, eles em vez disso obtém 584 uma licença exclusiva da universidade. Isto não é nenhum segredo; é 585 abertamente admitido por todos os interessados. Já se os pesquisadores não 586 fossem expostos à tentação de fazer estas coisas, eles ainda assim fariam 587 suas pesquisas.</p> 588 <p> 589 Programadores que escrevem software livre podem ganhar a vida vendendo 590 serviços relacionados ao software. Eu tenho sido contratado para portar o <a 591 href="/software/gcc/">compilador C GNU</a> para novos equipamentos, e para 592 fazer extensões à interface do usuário no <a href="/software/emacs/">GNU 593 Emacs</a>. (Eu ofereço estas melhorias ao público uma vez que elas ficam 594 prontas.) Eu também ensino em salas de aula, pelo que eu sou pago.</p> 595 <p> 596 Eu não sou o único que trabalha desta forma; existe hoje uma empresa 597 crescente e bem sucedida que não faz outra coisa. Diversas outras empresas 598 também fornecem suporte comercial para software livre do sistema GNU. Isto é 599 o começo de uma indústria de suporte ao software independente — uma 600 indústria que poderia se tornar muito grande se o software livre se tornasse 601 predominante. Ela dá aos usuários uma opção geralmente não disponível para o 602 software privativo, exceto para os muito ricos.</p> 603 <p> 604 Novas instituições tais como a <a href="/fsf/fsf.html">Free Software 605 Foundation</a> podem também pagar programadores. A maior parte dos fundos da 606 fundação vem de usuários comprarem fitas através do correio. O software nas 607 fitas é livre, o que significa que todo usuário tem a liberdade de copiá-lo 608 e alterá-lo, mas muitos apesar de tudo pagam para obter cópias. (Lembre-se 609 que “free software” se refere a liberdade e não preço). Alguns usuários 610 adquirem fitas para as quais eles já tem uma cópia, como uma maneira de 611 fazer uma contribuição que eles sentem que nós merecemos. A fundação também 612 recebe donativos consideráveis de fabricantes de computadores.</p> 613 <p> 614 A Free Software Foundation é uma entidade, e suas receitas são gastas 615 contratando tantos programadores quanto possível. Se ela tivesse sido feita 616 para ganhos financeiros, distribuindo o mesmo software livre ao público 617 pelos mesmos valores, daria agora uma vida muito boa ao seu fundador.</p> 618 <p> 619 Em virtude da fundação ser uma entidade, programadores frequentemente 620 trabalham pra ela por metade do que eles poderiam ganhar em outro 621 lugar. Eles fazem isto porque nós somos livres de burocracia, e porque eles 622 sentem satisfação em saber que seu trabalho não será obstruído. Acima de 623 tudo, eles fazem isso porque programar é divertido. Fora isso, voluntários 624 têm escrito muitos programas úteis para nós. (Recentemente mesmo escritores 625 técnicos começaram a se oferecer.)</p> 626 <p> 627 Isto confirma que programação está entre as áreas mais fascinantes de todas, 628 junto da música e da arte. Nós não temos medo que ninguém queira programar.</p> 629 630 <h4 id="owe">O Que os Usuários Devem aos Desenvolvedores?</h4> 631 <p> 632 Existe uma boa razão para os usuários de software sentirem uma obrigação 633 moral de contribuir para seu suporte. Desenvolvedores de software livre 634 estão contribuindo para as atividades dos usuários, e é justo e a longo 635 prazo interessante para os usuários prover os fundos para continuar.</p> 636 <p> 637 No entanto, isto não se aplica a software privativo, uma vez que o 638 obstrucionismo merece uma punição em vez de uma recompensa.</p> 639 <p> 640 Nós temos assim um paradoxo: o desenvolvedor de software útil tem direito ao 641 suporte dos usuários, mas qualquer tentativa de tornar esta obrigação moral 642 numa exigência destrói a base para a obrigação. Um desenvolvedor pode tanto 643 merecer a recompensa quanto exigi-la, mas não ambos.</p> 644 <p> 645 Eu acredito que um desenvolvedor ético defrontado com este paradoxo deve 646 agir de modo a merecer a recompensa, mas deveria também solicitar aos 647 usuários donativos voluntários. No final das contas os usuários irão 648 aprender a suportar os desenvolvedores sem coerção, assim como eles 649 aprenderam a suportar as estações públicas de rádio e televisão.</p> 650 651 <h3 id="productivity">O Que É Produtividade De Software? </h3> 652 <p> 653 Se o software fosse livre, ainda assim existiriam programadores, mas talvez 654 um número menor deles. Seria isto ruim para a sociedade?</p> 655 <p> 656 Não necessariamente. Hoje as nações avançadas têm menos fazendeiros que em 657 1900, mas nós não achamos que isto seja ruim para a sociedade, porque os em 658 menor número fornecem mais comida aos consumidores do que os em maior número 659 faziam. Nós chamamos isso de produtividade melhorada. Software livre 660 exigiria muito menos programadores para satisfazer a demanda, por causa da 661 produtividade de software aumentada em todos os níveis:</p> 662 663 <ul> 664 <li> Uso mais amplo de cada programa que é desenvolvido.</li> 665 <li> A habilidade de adaptar programas para personalização em vez de começar do 666 zero.</li> 667 <li> Melhor educação de programadores.</li> 668 <li> A eliminação de esforço de desenvolvimento duplicado.</li> 669 </ul> 670 671 <p> 672 Aqueles que se opõem à cooperação porque isso resultaria no emprego de menos 673 programadores, estão na verdade se opondo à produtividade melhorada. Estas 674 mesmas pessoas normalmente concordam com a crença largamente aceita que a 675 indústria de software precisa de produtividade melhorada. Pode?</p> 676 <p> 677 “Produtividade de Software” pode significar duas coisas diferentes: a 678 produtividade geral de todo o desenvolvimento de software ou a produtividade 679 de projetos individuais. Produtividade geral é o que a sociedade gostaria de 680 ver melhorada e a maneira mais direta de fazer isto é eliminar os obstáculos 681 artificiais à cooperação que a reduzem. Mas pesquisadores que estudam a área 682 de “produtividade de software” focam somente no segundo, limitado, sentido 683 da frase, onde melhoria requer avanços tecnológicos difíceis.</p> 684 685 <h3 id="competition">A Competição É Inevitável?</h3> 686 <p> 687 É inevitável que as pessoas tentem competir, sobrepujando seus rivais em 688 sociedade? Talvez sim. Mas competição por si só não é prejudicial; o que é 689 prejudicial é o <em>combate</em>.</p> 690 <p> 691 Existem maneiras de competir. Competição pode consistir de tentar alcançar 692 cada vez mais, exceder o que outros fizeram. Por exemplo, antigamente, 693 haviam competições entre magos da programação — competição para ver quem 694 poderia fazer o computador executar a coisa mais impressionante, ou fazer o 695 mais curto ou mais rápido programa para uma dada tarefa. Este tipo de 696 competição pode beneficiar a todos, <em>contanto que</em> o espírito 697 esportivo seja mantido.</p> 698 <p> 699 Competição construtiva é competição suficiente para motivar pessoas a 700 grandes esforços. Algumas pessoas estão competindo para ver quem será o 701 primeiro a ter visitado todos os países da Terra; alguns até mesmo já 702 gastaram fortunas tentando isso. Mas eles não subornam capitães de navio 703 para encalhar seus rivais em ilhas desertas. Eles estão satisfeitos em que 704 vença o melhor.</p> 705 <p> 706 Competição se torna combate quando os competidores começam a tentar impedir 707 um ao outro de avançar — quando o “que vença o melhor” dá lugar ao “que eu 708 vença, sendo ou não o melhor.” Software privativo é prejudicial, não porque 709 seja uma forma de competição, mas porque é uma forma de combate entre 710 cidadãos da nossa sociedade.</p> 711 <p> 712 Competição em negócios não é necessariamente combate. Por exemplo, quando 713 duas mercearias competem, todo seu esforço é para melhorar as suas próprias 714 operações, não para sabotar a rival. Mas isto não demostra um compromisso 715 especial com a ética de negócios; em vez disso, há pouco espaço para combate 716 nesta linha de negócio a não ser violência física. Nem todas as áreas de 717 negócio compartilham esta característica. Ocultar informação que poderia 718 ajudar o avanço de todos é uma forma de combate.</p> 719 <p> 720 Ideologia de negócios não prepara pessoas para resistir à tentação de 721 combater na competição. Algumas formas de combate tem sido banidas com leis 722 antitruste, leis que exigem a verdade em anúncios, e assim por diante, mas 723 em vez de generalizar isto para obter um princípio de rejeição ao combate em 724 geral, executivos inventam outras formas de combate que não são 725 especificamente proibidas. Os recursos da sociedade são gastos no 726 equivalente econômico da guerra civil faccionária.</p> 727 728 <h3 id="communism">“Por Que Você Não Se Muda Pra Rússia?”</h3> 729 <p> 730 Nos Estados Unidos, qualquer um que defenda outra coisa que não a mais 731 extrema forma de política egoísta de não intervencionismo tem ouvido 732 frequentemente esta acusação. Por exemplo, é dito isso aos que defendem um 733 sistema de saúde nacional, tal como os encontrados em todas as outras nações 734 industrializadas do mundo livre. Também dizem isso aos que defendem o 735 suporte público para as artes, também universal em nações desenvolvidas. A 736 ideia que cidadãos tenham qualquer obrigação para com o bem público é 737 identificada nos Estados Unidos como Comunismo. Mas quão similar são estas 738 ideias?</p> 739 <p> 740 Comunismo como praticado na União Soviética era um sistema de controle 741 central onde toda atividade era regimentada, supostamente para o bem comum, 742 mas na prática em prol dos membros do partido Comunista. E onde os 743 equipamentos de cópia eram guardados hermeticamente para evitar cópias 744 ilegais.</p> 745 <p> 746 O sistema Americano de copyright exerce um controle central sobre a 747 distribuição de um programa, e guarda os equipamentos de cópia com esquemas 748 de proteção contra cópia automáticos para evitar a cópia ilegal.</p> 749 <p> 750 Em contraste, eu estou trabalhando para construir um sistema onde pessoas 751 são livres para decidir suas própria ações; em particular, livres para 752 ajudar seus companheiros, e livres para alterar e melhorar as ferramentas 753 que elas usam no seu cotidiano. Um sistema baseado em cooperação voluntária 754 e decentralização.</p> 755 <p> 756 Assim, se nós temos que julgar pontos de vista pelas suas semelhanças com o 757 Comunismo Russo, são os donos de software que são os Comunistas.</p> 758 759 <h3 id="premises">A Questão das Premissas</h3> 760 <p> 761 Eu assumo neste documento que um usuário de software não é menos importante 762 que um autor, ou até mesmo que o empregador de um autor. Em outras palavras, 763 seus interesses e necessidades têm igual peso, quando nós decidimos que 764 curso de ação é melhor.</p> 765 <p> 766 Esta premissa não é universalmente aceita. Muitos mantêm que um empregador 767 de autor é fundamentalmente mais importante que qualquer um. Eles dizem, por 768 exemplo, que o propósito de ter donos de software é dar ao empregador do 769 autor a vantagem que ele merece — sem levar em consideração como isto pode 770 afetar o público.</p> 771 <p> 772 Não é comum tentar provar ou desaprovar estas premissas. Prova requer 773 premissas compartilhadas. Sendo assim a maior parte do que eu disse é 774 somente para aqueles que compartilham as premissas que eu adoto, ou pelo 775 menos estão interessados em quais são suas consequências. Para aqueles que 776 acreditam que os donos são mais importantes que todos os demais, este 777 documento é irrelevante.</p> 778 <p> 779 Mas por que um grande número de Americanos iria aceitar uma premissa que 780 eleva certas pessoas em importância acima de todos os outros? Parcialmente 781 por causa do credo que esta premissa é parte das tradições legais da 782 sociedade Americana. Algumas pessoas sentem que duvidar da premissa 783 significa desafiar as bases da sociedade.</p> 784 <p> 785 É importante para estas pessoas saber que esta premissa não é parte da nossa 786 tradição legal. Nem nunca foi.</p> 787 <p> 788 Assim, a Constituição diz que o propósito do copyright é “promover o 789 progresso da ciência e das artes úteis.” A Suprema Corte foi além disso, 790 afirmando em <em>Fox Film vs. Doyal</em> que “O único interesse dos Estados 791 Unidos e o principal objetivo em conferir o monopólio [de copyright] reside 792 nos benefícios derivados pelo público a partir do trabalho dos autores.”</p> 793 <p> 794 Nós não temos que concordar com a Constituição ou com a Suprema Corte. (Uma 795 vez, ambas perdoaram a escravidão.) Sendo assim suas posições não desaprovam 796 a premissa da supremacia do dono. Mas eu espero que o anúncio que isto é uma 797 concepção radical direitista em vez de uma tradicionalmente reconhecida 798 venha enfraquecer seu apelo.</p> 799 800 <h3 id="conclusion">Conclusão</h3> 801 <p> 802 Nós gostamos de pensar que nossa sociedade estimula o auxílio mútuo; mas 803 cada vez que nós recompensamos alguém pelo seu obstrucionismo, ou o 804 admiramos pela riqueza que ele ganhou deste modo, nós estamos enviando a 805 mensagem oposta.</p> 806 <p> 807 O entesouramento de software é uma faceta da nossa disposição geral de 808 desrespeitar o bem estar social em prol do ganho pessoal. Nós podemos vir 809 acompanhando este desrespeito desde Ronald Reagan a Dick Cheney, desde Exxon 810 a Enron, desde a falência dos bancos à falência das escolas. Podemos medir 811 isto pelo tamanho da população sem-teto e da população carcerária. Este 812 espírito antissocial alimenta a si mesmo; porque quanto mais nós vemos que 813 outras pessoas não irão nos ajudar, mais nos parece fútil ajudá-las. Assim a 814 sociedade vai decaindo até se tornar uma selva.</p> 815 <p> 816 Se nós não queremos viver numa selva, devemos mudar nossas atitudes. Devemos 817 começar enviando a mensagem que um bom cidadão é um que coopera quando 818 apropriado, não um que é bem sucedido tirando dos outros. Eu espero que o 819 movimento pelo software livre contribua para isto: pelo menos em uma área 820 nós iremos substituir a selva por um sistema mais eficiente que encoraja e 821 confia na cooperação voluntária.</p> 822 <div class="column-limit"></div> 823 824 <h3 id="footnotes" class="footnote">Notas de Rodapé</h3> 825 826 <ol> 827 <li id="f1">A palavra “free” em “free software” refere-se à liberdade, e não ao preço; o 828 preço pago por uma cópia de um “free software” pode ser zero, ou pequeno, ou 829 (raramente) bem grande.</li> 830 831 <li id="f2">Os problemas da poluição e do congestionamento não alteram esta 832 conclusão. Se nós desejamos tornar o ato de guiar mais caro para 833 desencorajá-lo em geral, é desvantajoso fazer isto usando pedágios, que 834 contribuem tanto para a poluição quanto para o congestionamento. Um imposto 835 sobre a gasolina é muito melhor. Da mesma forma, um desejo de melhorar a 836 segurança limitando a velocidade máxima não é relevante; a via de acesso 837 livre melhora a velocidade média evitando paradas e atrasos, para qualquer 838 limite de velocidade dado.</li> 839 840 <li id="f3">Alguém poderia observar que um programa de computador em particular é uma 841 coisa prejudicial e que não deveria estar disponível, como a base de dados 842 de informações pessoais Lotus Marketplace, que foi retirada de venda devido 843 à desaprovação pública. A maior parte do que eu digo não se aplica a este 844 caso, mas faz pouco sentido argumentar que seria bom ter um dono porque ele 845 tornaria o programa menos disponível. O dono não o tornaria 846 <em>completamente</em> não disponível, como seria desejável no caso de um 847 programa cujo uso fosse considerado destrutivo.</li> 848 </ol> 849 850 <hr class="no-display" /> 851 <div class="edu-note c"><p id="fsfs">Este ensaio foi publicado em <a 852 href="https://shop.fsf.org/product/free-software-free-society/"><cite>Software 853 Livre, Sociedade Livre: Artigos selecionados de Richard 854 M. Stallman</cite></a>.</p></div> 855 </div> 856 857 <div class="translators-notes"> 858 859 <!--TRANSLATORS: Use space (SPC) as msgstr if you don't have notes.--> 860 </div> 861 </div> 862 863 <!-- for id="content", starts in the include above --> 864 <!--#include virtual="/server/footer.pt-br.html" --> 865 <div id="footer" role="contentinfo"> 866 <div class="unprintable"> 867 868 <p>Envie perguntas em geral sobre a FSF e o GNU para <a 869 href="mailto:gnu@gnu.org"><gnu@gnu.org></a>. Também existem <a 870 href="/contact/">outros meios de contatar</a> a FSF. Links quebrados e 871 outras correções ou sugestões podem ser enviadas para <a 872 href="mailto:webmasters@gnu.org"><webmasters@gnu.org></a>.</p> 873 874 <p> 875 <!-- TRANSLATORS: Ignore the original text in this paragraph, 876 replace it with the translation of these two: 877 878 We work hard and do our best to provide accurate, good quality 879 translations. However, we are not exempt from imperfection. 880 Please send your comments and general suggestions in this regard 881 to <a href="mailto:web-translators@gnu.org"> 882 883 <web-translators@gnu.org></a>.</p> 884 885 <p>For information on coordinating and contributing translations of 886 our web pages, see <a 887 href="/server/standards/README.translations.html">Translations 888 README</a>. --> 889 A equipe de traduções para o português brasileiro se esforça para oferecer 890 traduções precisas e de boa qualidade, mas não estamos isentos de erros. Por 891 favor, envie seus comentários e sugestões em geral sobre as traduções para 892 <a 893 href="mailto:web-translators@gnu.org"><web-translators@gnu.org></a>. 894 </p><p>Consulte o <a href="/server/standards/README.translations.html">Guia 895 para as traduções</a> para mais informações sobre a coordenação e a 896 contribuição com traduções das páginas deste site.</p> 897 </div> 898 899 <p>Copyright © 1991, 1992, 1998, 2006, 2010, 2021 Free Software 900 Foundation, Inc.</p> 901 902 <p>Esta página está licenciada sob uma licença <a rel="license" 903 href="http://creativecommons.org/licenses/by-nd/4.0/deed.pt_BR">Creative 904 Commons Atribuição-SemDerivações 4.0 Internacional</a>.</p> 905 906 <!--#include virtual="/server/bottom-notes.pt-br.html" --> 907 <div class="translators-credits"> 908 909 <!--TRANSLATORS: Use space (SPC) as msgstr if you don't want credits.--> 910 Traduzido por: 911 Juciê Dias Andrade, 2001; 912 Rafael Fontenelle <a 913 href="mailto:rafaelff@gnome.org">rafaelff@gnome.org</a>, 2017-2021</div> 914 915 <p class="unprintable"><!-- timestamp start --> 916 Última atualização: 917 918 $Date: 2021/11/11 15:30:25 $ 919 920 <!-- timestamp end --> 921 </p> 922 </div> 923 </div> 924 <!-- for class="inner", starts in the banner include --> 925 </body> 926 </html>